sexta-feira, 27 de julho de 2007

Falsa Catarse

Afogando-me no meu plasma matinal, acordo um pouco atordoado pela ressaca. Ontem foi sábado, ou talvez sexta, ou talvez nunca tenha sido. Meu corpo parece um pedaço morto de carne, desconectado da minha cabeça e fora do alcance de qualquer impulso cerebral que o faça se mover de forma voluntária. Demoro a perceber a asquerosidade do meu quarto, o chão inundado em uma mistura de fluidos e alimentos não digeridos e o cheiro acre que me impele a me arrastar para o quintal.

Sentado no jardim, costas apoiadas no muro, cego pelo sol e abatido pelo mal estar, começo a sentir um vazio enorme dentro de mim. Enumero os motivos para me sentir assim. Talvez seja repulsa de me encontrar em tal estado, talvez seja agonia de me ver abandonado naquele pátio imundo ou talvez seja a constatação de que eu tenha perdido qualquer interesse em viver e que minha existência não era mais do que emoções enganosas e instantes vazios. Tudo se resumia a delírio e degradação, euforia e desalento, orgasmo e desprezo. Não haviam refúgios, momentos de calmaria ou um abraço morno de um amigo. Eu ia do céu ao fundo do abismo em segundos e repetia tudo alucinadamente. Eu era o artista que após ser ovacionado por milhares de pessoas se via sozinho no baixar das cortinas. Foi então que notei meu cachorro destroçar um pedaço de carne e conclui que aquela fraqueza era causada apenas pela fome.

Após comer um cacho de bananas e beber uma caixa de leite, me senti um pouco melhor. Comecei a deprimente tarefa de limpar a sujeira que havia feito em meu quarto. Notei com repugnância que havia deixado um rastro daquele asco no momento em que rastejei pelo cômodo. Eu finalmente havia me tornado um verme, após tantas seções auto-destrutivas. A limpeza demorou mais do que eu imaginava, em parte por ter subestimado a densidade daquela imundice toda e também por eu passar a maior parte do tempo cheirando os produtos de limpeza. E com um pedaço de pano encharcado com químicas desconhecidas cobrindo meu rosto, vi como uma aparição aquela olhar final de rejeição, aquele que havia me condenado a esta patética encarnação de narcisismo e autocomiseração a qual jamais consegui me libertar. E com os olhos ardendo em transe, voltei a desfalecer, e não posso afirmar com certeza se voltei a despertar.

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