terça-feira, 17 de março de 2009

O Verão não é bom para colheitas

Janeiro... nada.
Fevereiro... porra nenhuma
Março...

É bem incômoda esta ausência de palavras. O truque é conseguir que a primeira sentença seja perfeita, depois o resto vem por espasmos.

IDÉIAS PARA UMA 1ª SENTENÇA PERFEITA:

- Sentado sobre a grama molhada, o menino avalia os primeiros efeitos de uma estranha droga.
(Autobiográfico ou fantasioso? Há algum propósito em avançar aqui?)

- A lâmina da faca refletiu seus olhos e seus lábios sussurraram: “Até quando?”
(Conflitos existenciais compressos em clichês. Eu não consigo escrever nada sem a palavra “lábios” no meio?)

- “Como você prefere morrer: Como Ícaro ou como Narciso?”, ele indagou em sua juventude febril.
(Idéia promissora. Estética pobre. Desenvolver mais tarde?)

Sem chance. Preguiça mental. Além disso, o texto exige um mergulho emocional pesado demais e eu não me sinto disposto. Que sabe um poema erótico por hora?

Um que não tenha a palavra “lábios”?

...

Merda.
Não é assim com poemas. Você não os planeja, não os pensa, eles vêm, exigem ser escritos. É um processo natural. Como uma paixão. Como uma diarréia. Hoje não é o dia.

Talvez algo engraçado, despretensioso, faz tempo que eu não faço algo assim

ERIC, O CARPINTEIRO A PROVA DE JINGLES

Er... isso me parece bem pretensioso... e nada engraçado.

Ok, meu caderno de rascunhos pode ter a salvação. Vejamos. Algumas frases de efeitos, rimas pobres, provocações teológicas, enfim, nenhuma idéia original.

Ok.

Minha última chance. Um relato de meu dia. Estilo um diário. Sempre quis ter um diário, mas tenho problemas com prazos.

RELATO DE UM DIA QUALQUER – HOJE

Hoje eu acordei um minuto antes do despertador tocar, mas continuei na cama até que o alarme soasse.

No trabalho li um artigo sobre doenças mentais bizarras e me perguntei se não sofro nenhuma delas, e em caso positivo, como eu poderia saber?

Uma goteira no meio do escritório destruiu alguns jornais e um e-mail. Todo mundo achou engraçado.

Fiquei completamente encharcado no caminho do trabalho até o metrô. Troquei de camisa no meio da estação e as pessoas olharam assustadas.

Observei do trem uma das maiores tempestades que já presenciei. O vagão passou por um rio onde a água quase transbordava. Fiquei tão impressionado que troquei olhares com um estranho e disse “Nossa!” e ele respondeu “Complicado”.

Percebi a inutilidade de pegar um ônibus e fui a pé para casa. Me senti um monge zen caminhando serenamente em meio ao caos do trânsito. Atravessei uma ponte inundada e pensei na possibilidade de contrair leptospirose. Observei a devastação causada pela chuva, à sujeira das ruas e as expressões atônitas. Me senti feliz, como se fosse imune a tudo.

Cheguei em casa. O vizinho escutava Miles Davis no último volume. Ótimo gosto. Tomei banho e inventei uma canção sobre leptospirose. Não lembro como era a letra. Jantei duas coxas de frango. Limpei o vômito do meu gato. Senti tédio e comecei a escrever. Não sei que horas vou dormir.

FIM DO RELATO

Caralho.
Eu sou um zumbi renascido de uma lobotomia. Eu sou uma criatura mitológica que deu à luz a um demônio através de um aneurisma cerebral. Eu acabei de cagar um tumor colossal. Que alivio! Minha cabeça estava doendo por excesso de idéias e escassez de ação. Por que é tão difícil escrever no verão? É culpa do calor? Eu sou muito preguiçoso? Por que foi preciso um dilúvio para me inspirar?

...

Para mim, tempestades são bons presságios.

segunda-feira, 2 de março de 2009

À Espera dos Anjos

Gabriel atravessa o deserto
Ele desperta de um sonho
Ninguém está por perto
Para ouvir sobre o fogo

Gabriel está alerta
Gabriel se sente ansioso
Sua mente está repleta
De idéias para um novo consolo

Gabriel quer paz interna
Desvendar a misteriosa força
Gabriel quer aquelas pernas
Quer gosto de boceta na boca

Gabriel é o peregrino
É o santo a procura do profano
Gabriel quer perigo
Mas não que lidar com os danos

À espera da primavera
À espera dos anjos
Eu não sei o que me espera
Através do vale dos sonhos