domingo, 19 de agosto de 2007

Energia Negativa

A porta bate com violência. “Que clichê me tornei!” pensou Gabriel, estupidamente deprimido por natureza. Atirou-se sobre a cama e buscou reunir todos os pensamentos negativos que vinha colecionando ao longo da vida e decidir qual deles estava o matando.
Ele tinha dezesseis anos quando se apaixonou pela primeira vez e ainda não tinha dezessete quando pulou daquela janela do segundo andar. Clavícula quebrada e horror na face de seus pais. “Tudo bem agora, foi uma estupidez...”.
Andava pelas ruas escuras e pelos becos onde as pessoas atiravam seu lixo. Roubava discos de vinis do seu avô, surdo há anos, e os vendia para um sebo no centro. Brincava com as crianças mais novas da vizinhança, cheirava cola em construções vazias e ia de bicicleta até a boca comprar bagulhos para os garotos barra pesada do seu bairro, em troca de algum dinheiro. Sentia desde pequeno que havia algo errado com ele, algo quebrado e doentio em seu interior. Talvez fosse um gene defeituoso, ou um desequilíbrio hormonal. A psicóloga tinha dito que ele era normal. “Mas por que estou sempre tão longe?” ele pensou decepcionado.
As luzes da pista o incomodavam. Aquela confusão de músicas, pessoas e bebidas o desnortearam e ele tentou fugir dali. No canto, uma garota chorava sozinha. Ele quis dizer alguma coisa, mas ninguém nunca havia lhe dito nada. Por que iria se importar agora?
Impressionava-se com a própria fragilidade. Se fazia de vitima o tempo todo, se afastava do grupo e se sentava sozinho, com medo de virar um estorvo. Seus amigos não percebiam, achavam que ele só estava bêbado demais para conversar.
Em uma noite quente, Gabriel se sentou na beira do telhado e se fez uma promessa. Encarou o horizonte e achou a vida grande demais para ele. Desceu as escadas pensando em viajar para um lugar que ninguém o conhecesse e viver como outra pessoa, abandonar a si mesmo para trás. Não hoje, mas um dia, em breve. Bateu a porta do quarto e teve vontade de chorar. Ele era um garoto inofensivo e todos gostavam dele por isso. Então ele se deu conta de que ao viver sem nunca ter machucado ninguém, ele não tinha feito diferença alguma. Adormeceu sem paz e por um instante pareceu apenas um menino.

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